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sábado, 12 de dezembro de 2009

A verdade da Opus Dei...

Uma das coisas mais estranhas do Opus Dei é sua falta de história. Funcionou durante sessenta anos e esperava-se que algum membro em alguma parte do mundo tivesse escrito um relato de seu desenvolvimento; como cresceu e estendeu-se; quem ingressou, onde e quando; quais foram os problemas e como resolveram-se; quais tensões existiam e como foram resolvidas; como empreenderam distintas obras apostólicas, e como decidiu-se sua política, etc. O lugar apropriado para tal tratamento seria o volume publicado em 1982 pela Universidade de Navarra para comemorar, algo tardiamente, os cinqüenta anos de aniversário do Opus Dei, baseado em 1928. Nele há um compartimento comprometedoramente intitulado ‘Opus Dei, cinqüenta anos de existência’, todavia, consiste somente em duas peças: um texto inédito até então de Escrivá e uma entrevista que não contribui com informação alguma referente à história da organização, com o novo presidente geral da associação, Monsenhor Alvaro del Portillo. Não é que algo de sua história não possa ser desenterrado a partir das muitas apologias do Opus que seus partidários publicaram através dos anos, entretanto, não se menciona diretamente nenhum estudo histórico no ensaio bibliográfico de Lucas F. Mateo–Seco, escrito para o volume do aniversário. O mais extraordinário é a escassez de obras sérias sobre qualquer aspecto do Opus, exceto no, recentemente, adquirido estatuto jurídico como prelatura pessoal.
Não obstante, de um acontecimento em particular não há escassez de relatos: do dia e do modo em que Escrivá decidiu fundar o que com o tempo se converteu no Opus Dei. Aconteceu, diz Vázquez com uma hipérbole compreensível de quem é membro devoto, ‘como semente divina caída do céu’. A idéia veio a Escrivá quando fazia retiro numa casa do subúrbio de Madrid, pertencente aos padres paulinos. Escrivá estava rezando e, afirma Bernal, ‘viu’ o Opus Dei. Ao mesmo tempo ouviu soar os sinos da próxima igreja de Nossa Senhora dos Anjos, que celebrava a festa patronal; em 2 de outubro é o dia em que os católicos comemoram a festa dos Anjos da Guarda.
O que aconteceu realmente, não está de todo claro. Alguns membros do Opus acreditam que Escrivá do Balaguer teve uma visão celestial, mas nem ele mesmo chega a afirmar tanto. De fato, afirma muito pouco. É bastante evidente que, sendo um jovem e ambicioso sacerdote em um país com muitos padres à maturação, procurava algum papel particular na vida. E não há nada mau nisso. Parece pelos diversos relatos da fundação, que durante suas meditações começou a vislumbrar qual poderia ser seu papel. Foi mais tarde, embora não muito depois, quando a primeira noção se fez mais clara e pôde dar os passos para pô-lo em marcha. Foi tudo o que aconteceu. Mas, como o Opus tem a propensão a maximizá-lo em tudo, ficou uma placa na fachada do novo campanário de Nossa Senhora de Los Angeles, e um dos antigos sinos levou-se ao Torreciudad em lembrança do fundador. A inscrição latina, grosseiramente traduzida, diz: ‘Enquanto os sinos da igreja de Madrid de Nossa Senhora de Los Angeles tocavam e elevavam suas vozes em oração aos céus, em 2 de outubro de 1928, Josemaría Escrivá do Balaguer recebeu na mente e no corpo as sementes do Opus Dei.’ O Opus poderia ter posto, mais adequadamente, uma placa no edifício em que o fundador recebeu sua primeira inspiração, mas já não está em pé.
O que exatamente Escrivá tinha fundado? Logo, há dúvidas no que se converteu o Opus Dei. Tem uma estrutura legal precisa, objetivos bem definidos e métodos inequívocos para levá-los a cabo. Porém, seria incomum para o fundador de uma organização religiosa dentro da Igreja católica prever, exatamente, até o último detalhe, o que seria tal organização. Os franciscanos, por exemplo, passaram por muitos traumas durante décadas, se não durante séculos, conflitos internos antes de estabelecer sua estrutura, e isso somente a custa de dividir a ordem. De modo que é razoável perguntar-se se a visão original de Escrivá realizou-se da forma que hoje se apresenta.
Não é que o problema seja assim tão simples. Escrivá viu que o Opus Dei se desenvolvia na forma em que o fazia, e incitou-a a continuar em seu caminho. O momento crucial pode estar no incidente que se explica mais adiante, quando voltou de Roma em 1946 com sua inocência ou sua ingenuidade quebrantada pela forma de atuar da cúria romana. Talvez, sua primeira idéia do que desejava criar fosse algo completamente distinto.
Bernal, por exemplo, descreve o Opus Dei como ‘uma 'organização desorganizada', plena de responsável espontaneidade. Isto estaria muito longe da experiência de alguns membros recentes. Ao morrer o fundador, comenta Vladimir Felzmann:
‘...regras, normativas e restrições cresceram. A vida se fez ainda mais restritiva... Para proteger e preservar seu espírito –para evitar o que aconteceu aos franciscanos–, o fundador dispôs uma codificação completa e meticulosa da obra do Opus Dei e da vida de seus membros. Mas, como nosso Senhor mesmo descobriu, um espírito encerrado em um código tende a voltar-se morto, lhe escravizem, farisaico’.
A ‘organização desorganizada’ de Bernal está próxima ao que Raimundo Pániker recorda dos primeiros tempos. Pániker era possivelmente o mais distinto teólogo acadêmico do Opus. Nascido em Barcelona, de pai índio e de mãe catalã, era cidadão britânico e, como tal, foi evacuado de Barcelona por um casco de navio de guerra britânico durante a Guerra Civil espanhola (1936–1939). Foi estudar na Alemanha, mas voltou para Barcelona em 1940, onde se uniu ao pequeno grupo de seguidores de Escrivá, que exerciam atividades na cidade. Ordenou-se sacerdote em 1946, um segundo grupo de membros do Opus que foram ordenados. Deixou o Opus em 1965. Suas lembranças dos primeiros tempos confirmam a descrição do Bernal.
Diz Pániker que quando chegou ao Opus era quase um movimento ‘contra-cultural’.
Gente como ele se uniu ao Opus porque parecia oferecer um modo de superar a ‘rotina do catolicismo’. Simplesmente queriam tomar a sério a religião, seguir o Evangelho em todas as exigências impostas sobre quem quer ser discípulo de Cristo. Há uma velha tradição ascética na Igreja que compara ao devoto com a ‘militia Christi’, os soldados de Cristo, e foi esta expressão que utilizou Pániker para os primeiros membros do Opus. Não havia, além de Escrivá, mais que um grupo de laicos que tentavam pôr o Evangelho em ação. Não havia uma forma de vida especial, nenhuma fuga do mundo. Não devia haver nada que os distinguisse exceto, possivelmente, que, para ajudar-se mutuamente, viviam juntos. Aquele, pois, era o ideal que Escrivá do Balaguer oferecia aos que se achavam sob sua influência.
As pessoas submetiam-se rapidamente à ela. Assim que recebeu a mensagem divina, lançou-se a procurar gente para sua causa. Falou de suas idéias a amigos de seus dias de estudante em Logroño e Zaragoza. Procurou apoio entre os sacerdotes que compartilhavam a casa onde se alojava em Madrid. Escreveu cartas a gente de fora da capital da Espanha. Perguntou à seus conhecidos e a aqueles para quem trabalhava como capelão, se conheciam candidatos varões adequados entre os jovens, e particularmente entre os estudantes. Disse ao padre Sánchez Ruiz, seu diretor espiritual, que se dava conta com crescente claridade de que o Senhor ‘quer que me esconda e que desapareça’. Não seguiu o conselho do Senhor. Fazia amizades influentes tanto entre o clero como entre os seculares, estava desenvolvendo o Opus através de suas cartas, cultivando a aristocracia e fazendo seus primeiros discípulos.
Alguns uniram-se a ele, todavia não ficaram. Outros, como Isidoro Zorzano Ledesma, que tinha estudado com ele em Logroño e a quem se encontrou por acaso em Madrid, morreu jovem. Uns amigos da Faculdade de Medicina de Madrid apresentaram-o ao João Jiménez Vargas, estudante de tal Faculdade. Encontrou a outros por meio do confessionário ou através das Damas Apostólicas, de quem era capelão. Uniram-se ao Escrivá em um momento crucial da História da Espanha, timidamente, em palavras do Pániker, um ‘movimento contra-cultural’.

Michael Walsh - Opus Dei (fragmento)